O direito mais importante

O direito mais importante

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Direitos fundamentais e cláusula pétrea

Parte da teoria dos direitos fundamentais argumenta que no conteúdo de uma teoria geral respectiva não há espaço para se discutir a questão das cláusulas pétreas, pois estas estariam afetas ao tema maior do poder de reforma constitucional e seus limites materiais (nesse sentido, ver Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins, Teoria Geral dos Direitos Fundamentais, RT, SP, 2008). Este autor assim não pensa. É que essa concepção é uma concepção bastante restrita de teoria geral dos direitos fundamentais, pois, conforme escrito em livro específico, tal postura epistemológica seria criar uma fronteira no interior de uma fronteira (Paulo Thadeu Gomes da Silva, Direitos Fundamentais: contribuição para uma teoria geral, Atlas, SP, 2010). Para o adequado aprendizado, em termos de teoria geral dos direitos fundamentais, entende-se necessária a problematização a respeito do valor que se deva atribuir a esses direitos como sendo componentes de limitação material expressa ao poder de reforma constitucional. Pois bem, nessa linha, quando do julgamento, pelo STF, da chamada Lei da Ficha Limpa, Lei Complementar n. 135, de 7.6.2010, no voto lido pelo Ministro Gilmar Mendes, uma questão de grande relevância teórica veio à tona, representada pela afirmação do mesmo Ministro no sentido de que direito fundamental positivado na Constituição pelo poder constituinte derivado não seria cláusula pétrea. A perplexidade tomou conta de seus colegas, sendo certo que o Ministro Carlos Britto perguntou a Gilmar Mendes se era isso mesmo, e a Ministra Cármen Lucia fez a mesma pergunta, quando então o Ministro Gilmar Mendes afirmou que poderia haver disputa sobre essa posição, mas que, naquele caso concreto, a norma parâmetro seria o artigo 16, e não o artigo 14, § 9, ambos da Constituição, para se aferir a constitucionalidade da antecitada lei naquilo que dizia com o princípio da anterioridade eleitoral. A questão, portanto, se resumia ao seguinte: a norma do artigo 14, § 9, da Constituição, foi positivada por meio da Emenda Constitucional de Revisão n. 4/1994, que acrescentou à redação original do mesmo artigo as expressões “a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e”, após a expressão “a fim de proteger”, passando o dispositivo a vigorar com a seguinte redação. Foi a partir dessa redação que se fez a lei complementar objeto do recurso extraordinário em pauta, embora o STF tenha decidido não decidir, produzindo um verdadeiro non liquet. O ponto importante na discussão era o de se saber qual norma constitucional poderia ser tida na conta de norma parâmetro para efeito do controle de constitucionalidade ali incidente, e a resposta a esse problema dependia da compreensão que se poderia atribuir às normas criadas por emendas constitucionais: no caso da do artigo 14, § 9, veiculadora, na opinião de alguns ministros, de direito fundamental, era ela que deveria servir como norma parâmetro, ainda que criada por emenda constitucional de revisão na parte que interessava ao julgamento; para outros ministros, a norma parâmetro era aquela do artigo 16, que preceituava o princípio da anterioridade eleitoral e que havia sido positivada na Constituição pelo poder constituinte originário, ainda que tenha sofrido mudança não substancial por meio de emenda constitucional.
A noção de cláusula pétrea teve origem na Constituição norte-americana de 1787, lá chamada de entrenched ou entrenchment clause (algo como cláusulas fortificadas/reforçadas), e que tanto exigia um quórum qualificado para se reformar determinadas matérias constitucionais quanto considerava não passíveis de reforma as normas do artigo 5º, que continha duas cláusulas dessa natureza: a) uma que se referia à proibição de se editar lei que tratasse do comércio internacional de escravos e que expirou em 1808; b) outra, que vige até o momento, segundo a qual nenhum Estado, sem o seu consentimento, será privado do direito igual de voto no Senado, o que apenas demonstra a dificuldade de formação da própria União com a abdicação da soberania dos Estados-Membros, estes que se tornaram autônomos. Essa formulação constitucional parece ter encontrado eco na Constituição Imperial de 1824, que em seu artigo 178 prescrevia que "E' só Constitucional o que diz respeito aos limites, e attribuições respectivas dos Poderes Politicos, e aos Direitos Politicos, e individuaes dos Cidadãos. Tudo, o que não é Constitucional, póde ser alterado sem as formalidades referidas, pelas Legislaturas ordinarias (sic)" e na Constituição Federal de 1891, que em seu artigo 90, § 4, preceituava que não poderão ser admitidos como objeto de deliberação, no Congresso, projetos tendentes a abolir a forma republicana federativa ou a igualdade da representação dos Estados no Senado, matérias que até hoje, na Constituição de 1988, constam do mesmo núcleo imodificável, embora a forma republicana seja objeto de dissenso. No Brasil jurista do porte de Rui Barbosa considerava a cláusula pétrea uma questão da política, e não do jurídico, posição essa que bem se pode extrair de seus Comentários à Constituição de 1891, cujos debates travados com outros parlamentares estão ali reproduzidos, bem como pela passagem histórica no voto do Ministro Paulo Brossard quando da decisão proferida na ADI n. 939, que tratou da declaração de inconstitucionalidade da emenda que criou o antigo IPMF, mais tarde nomeado de CPMF, tributo que de provisório nada tinha, apenas o nome. Dessa breve história aos dias atuais certo é que a figura da cláusula pétrea como sendo jurídica encontra-se positivada no artigo 60, § 4º, I-IV, da Constituição Federal. Dado inserido na realidade constitucional e ali colocado pelo poder constituinte originário vem recebendo tratamento teórico no sentido de que só é cláusula pétrea aquilo que esse mesmo poder positivou como tal, o que vale, também, para a criação de direitos fundamentais, estes que, uma vez criados pelo poder constituinte reformador, e exatamente por isso, não podem ser tidos na conta de componentes do núcleo intangível da Constituição (Paulo Gustavo Gonet Branco, autor do capítulo específico, Gilmar Ferreira Mendes e Inocêncio Mártires Coelho, Curso de Direito Constitucional, Saraiva, SP, 2009). Como se pode perceber a complexidade da questão não é de pequena monta. Esse raciocínio, exposto no livro que se vem de citar, é sobremaneira simplificado. Essa simplificação produziria o pensamento absurdo de que os direitos fundamentais positivados na própria Constituição norte-americana sob a forma de Emendas não seriam cláusulas pétreas e poderiam bem ser alterados ou no limite revogados pelo mesmo poder constituinte reformador, o que soa, no mínimo, como algo sem sentido. O problema parece residir em que a consideração de uma norma constitucional como norma parâmetro é uma coisa, enquanto que a imutabilidade de direito fundamental criado por emenda constitucional é outra. Nesse quadro, pode-se perfeitamente, num aparente conflito para se aferir qual deve ser a norma parâmetro, apenas considerar uma ou outra, a depender do caso, desde que seu conteúdo material ou mesmo sua forma tenham força de significado suficiente a tanto, tudo sem a necessidade de se tecer considerações a respeito da intangibilidade ou não de um direito fundamental criado de forma derivada, e não originária. Tanto é adequada essa forma de interpretação constitucional quanto mais se pense em que mesmo norma positivada na Constituição por emenda constitucional e ainda que não seja de caráter fundamental pode ser tida na conta de norma parâmetro.
Com relação, especificamente, ao valor que se deva atribuir a uma norma de direito fundamental nascida por obra do poder constituinte derivado, penso que é de suma importância o amadurecimento teórico que necessariamente antecede a própria aplicação em caso concreto. De minha parte, e fundamentado numa compreensão material dos direitos fundamentais, entendo que um direito fundamental positivado no texto constitucional pelo poder constituinte derivado pode, sim, ser considerado como componente do núcleo inalcançável pelo próprio poder de reforma, e dessa forma raciocino porque a própria Constituição possui uma cláusula de abertura bastante generosa para com a criação de novos direitos fundamentais. Porém, tenho de admitir que a questão demanda, ainda, um forte amadurecimento teórico, fruto de um processo de reflexão no qual várias vozes sejam ouvidas, inclusive aquelas contrárias à posição aqui assumida. E nessa discussão talvez possa ter lugar uma outra, de maior envergadura, e que é representada pela própria possibilidade de um povo, sem romper com a normalidade democrática, sem revolução ou golpe de Estado, poder revogar a Constituição atual e elaborar uma outra. É isso. Sapere Aude! Paulo Thadeu.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Artigo publicado no jornal Carta Forense

Artigo de minha autoria publicado no sítio que segue:
http://www.cartaforense.com.br/Materia.aspx?id=6082 . É isso. Paulo Thadeu.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Livros banidos

No link http://www.archive.org/details/bannedbooks pode ser feito download de livros que já foram banidos: Ulisses, Cândido, A Origem das Espécies e muitos outros mais. Esses livros, hoje, são publicados normalmente, contudo, quando de sua primeira publicação, sofreram a ação da censura. Daí que é adequado considerar a concretização dos direitos fundamentais, no caso, o de liberdade de expressão da atividade literária, um trabalho em progresso. É isso. Sapere Aude! Paulo Thadeu.