O direito mais importante

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sexta-feira, 16 de abril de 2010

A semana e os direitos fundamentais

Realizou-se em Brasília, nos dias 13 e 14 de abril, o seminário Pluralismo Jurídico e Multiculturalismo, organizado pela Escola Superior do Ministério Público da União e presidido pela Dra. Deborah Duprat, atual Vice-Procuradora Geral da República. O evento contou com a participação de profissionais -professores, juízes, antropólogos- estrangeiros e de procuradores da república de todo o Brasil. Participei, muito honrado e na qualidade de debatedor, da mesa de abertura cuja palestrante foi a Profa. Catherine Walsh, norte-americana radicada no Equador e integrante da Universidade Simon Bolivar. À mesma mesa se encontravam a antropóloga Rita Segato e o colega constitucionalista de escol Daniel Sarmento, sessão presidida pela Dra. Deborah Duprat.
O texto-base apresentado pela Profa. Catherine Walsh e que serviu aos debates tem o título Interculturalidad crítica y pluralismo jurídico. Nesse texto são apresentadas as seguintes ideias: o pluralismo jurídico não é nada novo, mas sim o reconhecimento atual de uma prática histórica e antiga; a interculturalidade é algo mais abrangente que o pluralismo jurídico, pois enquanto este se limita a descrever a existência de várias esferas de direito, por exemplo, justiça indígena, afro-descendente, etc., a interculturalidade, que se conceitua como a construção de relações entre grupos, práticas, lógicas e conhecimentos distintos, tem o objetivo de confrontar e transformar as relações de poder e as estruturas e instituições que as mantêm. Nesse sentido, a interculturalidade crítica se diferencia da interculturalidade funcional, esta que se limita apenas a incluir determinadas demandas dos grupos secularmente discriminados na sociedade. Essa a descrição da proposta, agora seguem meus comentários.
A interculturalidade crítica nasce nos movimentos sociais indígenas latino-americanos, o que parece ser algo genuíno, autêntico, portanto, é um projeto político, e não uma formulação acadêmica qualquer. Sua passagem para o jurídico, como princípio jurídico da interculturalidade crítica, apresenta algumas dificuldades. Penso que, se se parte da premissa de que esse princípio deve, necessariamente, vir positivado na Constituição, então o ponto de partida é a própria Constituição, documento formal e de caráter ocidental que positiva direito fundamental de índole também ocidental. Daí que como projeto político refundador da sociedade, e desde que não seja nada relacionado a uma revolução, encontra limites na própria ordem jurídica, tais como, a própria prevalência de práticas culturais ocidentais e que não firam direito fundamental. É de se destacar, neste ponto, que o Equador é um  país com quatorze milhões de habitantes e com uma pequena maioria urbana e composta, quase em toda a sua maioria, de mestiços, especifidades essas bastante diferentes das que informam a sociedade brasileira. Todavia, isso não quer dizer que não haja a possibilidade de se construir um princípio jurídico da interculturalidade crítica que se desdobre em graus. O exemplo mais citado da interculturalidade jurídica é aquele positivado na Constituição equatoriana de 2008, texto no qual se pode ler que o modo de vida equatoriano deve ser o buen vivir, que significa, grosso modo, estabelecer uma relação de harmonia com a própria natureza, além do reconhecimento expresso de determinados direitos coletivos. No Brasil penso que a Constituição, pela cláusula de abertura do artigo 5, § 2, c/c artigo 215, 225 e 231, desse texto, permite que se pense na formulação do princípio jurídico da interculturalidade crítica, ao menos em um primeiro grau, e que deve dizer respeito ao reconhecimento e proteção de determinadas práticas culturais, e de que faz maior exemplo a necessidade de, quando em jogo direito inerente aos povos tradicionais, sempre se designar perícia para se ouvir o grupo, e não apenas o indivíduo, de vez que o coletivo é marca que distingue a organização dessas sociedades -coletivo que hoje é apropriado pela sociedade envolvente para descrever a instituição do direito difuso, o que implica reconhecer que as sociedades tradicionais nada têm de primitivo e de menos complexidade-. Penso que toda ideia merece reflexão, ainda que seja para refutá-la. É isso. Sapere aude! Paulo Thadeu.

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