O direito mais importante

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sexta-feira, 23 de abril de 2010

A semana e os direitos fundamentais

A semana fica marcada pelo paralelo que se pode fazer entre a troca de presidente no STF e a anunciada aposentadoria do Justice Stevens da Suprema Corte americana. O paralelismo desses eventos se justifica porque, seja na presidência de uma corte suprema, seja na substituição de um de seus membros, muitas consequências são produzidas e, se estamos a falar de jurisdição constitucional, essas consequências se referem, via de regra, aos direitos fundamentais. Com relação ao STF, penso que falta, no Brasil, uma imprensa com poder descritivo maior de crítica, pois, ao contrário do que se lê nas notícias referentes à Suprema Corte americana, nestas terras o que persiste é a manifestação de um espírito conciliador, sem que haja a necessária e direta crítica a respeito do exercício do poder pelas instituições. No caso do STF creio que a presidência do Min. Gilmar Mendes, que está de saída, foi marcada por um conservadorismo típico da formação bacharelística liberal apontada por Sérgio Adorno como uma das causas que contribuíram a que o Estado brasileiro não se despatrimonializasse. Essa postura conservadora se manifesta nas próprias opiniões do Ministro quando se mete a palpitar sobre tudo o que lhe é perguntado, inclusive sobre temas que mais tarde poderiam cair sobre sua mesa para que fossem julgados. Suas opiniões, em geral, tiveram a tônica da preservação, por exemplo, do direito de propriedade e, ao menos no que diz com o julgamento de Raposa Serra do Sol, ficou patente a falta de compreensão total e adequada do tema, seja elencando condicionantes que no meu ponto de vista deveriam ter sido tratadas pela lei, seja lançando interpretações que reputo equivocadas a respeito da matéria, v.g., o marco temporal da Constituição de 1988 como termo a quo para se comprovar eventual posse tradicional: não é posse civil, é o indigenato, Ministro! Essa postura conservadora se refletiu também no afastamento, sob o signo de uma certa discricionariedade, de regras processuais a fim de se conceder liberdade em Habeas Corpus. A análise desta questão, se feita de forma isolada, permite um grande mal entendido, no sentido de que quem critica essa decisão é visto como contrário à efetivação do direito de liberdade. Mas não é bem assim, pois o que se verifica é uma quase que absoluta processualização de questões envolvendo outros direitos fundamentais em detrimento de sua substância, e com relação ao direito de liberdade o que se manifesta é a desconsideração dessa mesma processualização em benefício do direito material. Pensar na não admissão da FUNAI em mandado de segurança que discuta direito indígena porque o instituto não admite a assistência é um exemplo do que vem de ser escrito. Uma outra característica que chama a atenção nos discursos do presidente que sai é a referência ao Estado de Direito, como se essa qualidade fosse ainda vigente. Não mais se trata de Estado de Direito, mas sim de Estado Democrático e Social de Direito, pelo qual não só os direitos individuais devem ser reconhecidos e protegidos, mas sim todas as demais espécies desse gênero. Já com relação ao presidente que assume, Min. Cezar Peluso, assisti a programa na televisão cuja análise do jornalista especializado, após proferir todo tipo de salamaleque, por exemplo, muito preparado, reconhecido como jurista, e assim por diante, afirmou que o novo presidente vai fazer história: com base em quais fatos alguém pode afirmar isso, em especial um profissional da imprensa? O Min. Cezar Peluso, oriundo da magistratura paulista, reconhecidamente uma magistratura conservadora no país, o que parece xingamento nestas plagas, notabilizou-se por julgar a extradição de Battisti, processo no qual tentou empreender uma interpretação que iria além do papel do STF no controle da legalidade do pedido, ficando ao talante do Presidente da República extraditar ou não o extraditando, o que, no meu modo de ver, constitui-se em equivocada interpretação da própria Constituição, que confere ao chefe do Executivo esse poder. Por certo que tudo é uma questão de interpretação, mas devemos nos posicionar a respeito desses temas e eventos. É o que acontece nos Estados Unidos, que se vê às voltas com a substituição do Justice Stevens, liberal, por um outro juiz que, na visão do Presidente Obama, também deve ser liberal, tudo para equilibrar o jogo de correlação de forças que hoje pende para os conservadores, cuja agressividade no ato de julgar e de impor suas visões de mundo é constatada diariamente. Nesse quadro a imprensa norte-americana não se exime de opinar, classificando de conservador ou liberal este ou aquele juiz: aqui no Brasil isso parece ser crime. Talvez tenha a ver com nosso espírito conciliador e o sentimento de que qualquer crítica seja uma crítica pessoal, transforme-se em uma dualidade "me ama/não me ama", maniqueísmo próprio de uma nação cuja maioria é católica. Vamos ver, nessa passagem de bastão na presidência do STF, como os direitos fundamentais serão concretizados, se por um viés conservador ou se por um liberal. Eu aposto no primeiro. É isso. Sapere aude. Paulo Thadeu.

Um comentário:

  1. De acordo Paulo.
    E vem mais conservadorismo/discricionariedade(arbitrariedade) por aí.
    Carlo Fabrizio

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