O direito mais importante

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quarta-feira, 26 de maio de 2010

Direito fundamental e sua evolução semântica

Defendo sempre, em minhas aulas, a ideia de que o estudo, mesmo dogmático, dos institutos do direito deve ser realizado lançando-se mão de conceitos construídos em outras áreas de conhecimento: uns chamam isso de interdisciplinaridade, outros de transdisciplinaridade, e assim por diante. De lado a adequada denominação que se deva atribuir ao fenômeno, o mais importante é ter em mira que quando se estuda direitos fundamentais tem-se de descrever um pouco a história em si mesma considerada para que se possa compreender, num nível mínimo de exigência, o real significado desses institutos, tais quais, liberdade, igualdade, dignidade da pessoa humana, etc... . Daí a necessidade de se fazer um histórico do conceito, e isso não significa apenas mencionar tal ou qual direito como positivado na Constituição respectiva. A descrição da história do conceito, por exemplo, liberdade, deve vir acompanhada de uma análise de seu significado aliado às estruturas sociais então vigentes, v.g., liberdade no Brasil Imperial, sob a Constituição de 1824, na República Velha, sob a Constituição de 1891, no Estado Novo, sob a Constituição de 1937 e na ditadura militar, sob a Constituição de 1967/1969. Esse modo de fazer, savoir faire, é inerente ao pensamento de Koselleck e de Luhmann, o primeiro na história, o segundo na sociologia. Percebam, ideias construídas fora do âmbito jurídico, mas que podem, perfeitamente, ser aproveitadas no jurídico, e mesmo no jurídico-positivo, na dogmática. Nesta altura pode-se pensar na inutilidade da simples menção do instituto jurídico tal como positivado na Constituição da época, pois que, por ser mera informação à disposição de quem quer que seja, nada produz com relação ao real significado do instituto, v.g., e mais uma vez, a liberdade. Dessa forma de analisar os institutos decorre, por exemplo, que a liberdade, nas origens da história do Brasil, sempre se referiu a apenas uma parcela da população e, ao menos na maioria das vezes, teve de ceder lugar à propriedade, num processo de interpretação constitucional que mal se poderia denominar de ponderação. E mesmo a inibida inclusão dos libertos na Constituição de 1824 significou a proteção da manutenção da escravidão, pois que quase 30% da população brasileira, àquele tempo, era de negros e mestiços. No limite significou, portanto, conciliação (ah!, mes racines, mes racines!!!). O mesmo se pense com relação à ideia de povo, que à época não existia como unidade, e talvez daí advenha a não positivação, na Constituição de 1891, de norma constitucional tida como cláusula de abertura dos direitos fundamentais, nos mesmos termos da siamesa norte-americana, que falava, pela Emenda n. IX, em outros direitos retidos pelo povo: no Brasil seria de se perguntar, mas de qual povo se trata? O pensamento aqui exposto demonstra a necessidade de se estudar os institutos jurídicos referidos às estruturas sociais existentes em seu tempo histórico correspondente. O que pode ser feito com o conceito de Constituição, mas este já é assunto para uma outra postagem. É isso. Sapere Aude! Paulo Thadeu.

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